segunda-feira, 26 de julho de 2010

O Propósito

Eu discordo da teoria que o Mystery apresenta como motivador ao estudo das dinâmicas sociais - a da Reprodução e Sobrevivência. Ela é boa para explicar os fenômenos sociais, porém não é um gerador de propósito que preste. Pelo menos não pra mim, um cético filho da puta.
Afinal, se nosso propósito é Replicar e alongar nossa Sobrevivência, qual é o sentido de evoluir, então?

Somos um misto entre robôs e animais, e da parte dos animais o Mystery deu uma abordagem boa. Porém não coube ao escopo do livro dele falar sobre lógica, é claro, pois um livro sobre atração é um livro diretamente sobre uma questão animal. No que fez falta para mim para a determinação da inclusão das técnicas de pickup e inner game no meu portfólio de coisas que quero jamais me desgrudar na vida.

Porque o tal Jogo é a metáfora da dinâmica social atual, e ela há de mudar cada vez mais rápido, até não haver nenhuma definível, ou algo muito homogêneo para que não seja entendido com facilidade. Isto é pra mim quando somente haverá o propósito, e formos imortais novamente. Mas esse dia não vai demorar a aparecer.
E mesmo que não mude, há de se fazer uma pergunta: Será que a real evolução estaria em se adaptar, igual a um mamífero qualquer, à dinâmica social de hoje? Ou quem sabe tentar mudá-la para algo que preste? Isto fica sujeito a um brianstorm, ficadica.

Uma coisa precisa ser pontuada: assim que houve uma primeira mente pensante, houve a geração do propósito, por isso ele já é necessário.

O propósito é um conceito com cardinalidade diferente porém de naipe igual ao de existir e o de lógica.

Você não pode negar a lógica, pois para negá-la teria que usar a própria lógica, o que a reafirma e gera um absurdo.

Você não pode argumentar sobre a existência de maneira que não seja local, ou seja, não pode usá-la à extensão do universo se o universo for Tudo. Pois se você afirma que o Não Existir não existe, então você também o reafirma, o que é absurdo. Logo o Não Existir EXISTE; o que o impede de considerar algo que é Tudo como existente, pois isso contradiz que o não existir existe.

O que podemos fazer é considerar tudo o que não existe como algo que ainda não foi concebido, pois uma vez que há a concepção de algo, essa coisa existe, sob as circunstâncias de sua concepção. Vampiros existem, mas é claro, não fisicamente, apenas em quadrinhos, filmes, imaginações, e a circunstância da existência deles é a que o responsável pela sua concepção determinou. Por isso o Felipe Neto tem razão em dizer que a porra da Stephenie Meyer fez uma merda que é qualquer coisa menos vampiro e lobisomem, pois eles já existem e são diferentes daquilo. Diferentes tanto quanto foram determinados ao serem concebidos.

Mas enfim, as coisas concebidas são as que existem. Desse modo, o conceito de existir é local. O universo, enquanto Tudo, não existe: ele simplesmente É.

Por fim o propósito. O propósito é considerado sinônimo de intenção. São Tomás de Aquino concorda com Descartes que intenção, propósito, vontade e liberdade são a mesma coisa: a faculdade através da qual somos dignos de louvor quando escolhemos bem, e dignos de reprovação, quando escolhemos mal.

Isso se a escolha existisse.  O primeiro post desse blog foi dedicado falar da inevitabilidade do acaso ou Vice-Versa (rá, já viu alguém fazer trocadilhos como esse?).

O propósito é o mais complicado dos três: Dizer que não há propósito é dizer que de nada serve a causalidade, da qual sai a análise que leva ao propósito. Isso pode ser complicado de figurar. Imagine quando não havia o conhecimento.

Quando não pensávamos, apenas baseávamos as cognições em análises superficiais geradas pelos sentidos e sentimentos, quando muito. Descobrimos que ao cairmos em cima de uma pedra, podíamos bater a cabeça e morrer; disso saiu a análise, e ela gerou a idéia de tentar jogar pedras ao caçar. Ou quem sabe como quando fomos descobrindo o que podíamos fazer com o fogo. Tudo isso gerou o propósito. O início do raciocínio analítico lógico gerou pequenas induções que eram motivadas pelo propósito. Nisso foi surgindo o raciocínio abstrato, a linguagem, a introspecção, enfim, a resolução dos Problemas.

A evolução apenas por evolução é um propósito e ao mesmo tempo um metapropósito. Ela gera replicação e sobrevivência também. Mas não só de corpos e sensações, como a evolução por seleção natural. Num ser com capacidade mental para operar sistemas de lógica, existe a evolução do conhecimento, dos paradigmas, das artes etc.

É nisso que a teoria do SR peca: ela não tem um propósito para humanos, só para animais que pensam. Pensem nisso.

O mais engraçado é que Mystery dizia que a mente dos homens evoluiu muito mais rápido que o corpo dos homens.

E ele tem razão: Existem datas do Australophitecus de 2.5 milhões de anos atrás, e do Homo Sapiens de 200.000 anos. Há 6mil anos surgiam a escrita cuneiforme e os hieroglifos, há 130 anos atrás surgiam a lâmpada elétrica e a primeira central de energia. Há 20 anos surgia o protocolo WWW e a internet começava a se difundir. Pois hoje todos nós estamos conectados através da internet e no futuro provavelmente estaremos cada vez mais conectados.

Nós não estamos aqui por que somos livres para estar aqui, nós estamos aqui porque não somos livres. Não há como escapar ou negar o propósito, nós sabemos que se não tivéssemos um propósito, nós não existiríamos.

É o propósito que nos cria. É o propósito que nos conecta. É o propósito que nos guia, que nos faz evoluir. É o propósito que nos define. É o propósito que nos liga, nos prende aqui.

E se vocês leram o conto de Asimov "A última pergunta", se lembrem aonde essa história de conexão vai parar.

Devíamos parar de ser egoístas e estúpidos e trabalhar para uma evolução de verdade. E não há meio de fazer isso sem ser nadando contra a maré.

Animais matam a si próprios para fazer valer a seleção natural.
Quem foi que disse que a natureza nos fez apenas animais?

Um comentário:

Guilherme Alfradique Klausner disse...

Genialíssimo! Mais um texto que vai entrar para o corpo de pensamento nosso, é imbatível em seus argumentos e, não digo só explicativo, mas perfeitamente congruente com as formas de pensar aqui apresentadas. Incorporarei ao meu canon e citarei! AUHHUA