quinta-feira, 4 de outubro de 2018

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Nenhuma ação no tempo pode ser julgada corretamente por um único estado de sua sucessão contínua, bem como nenhuma ação pode ser descontextualizada de outras ações paralelas numa mesma linha de tempo para o mesmo julgamento.

Nenhum governo pode ser julgado por um estado sólido, uma foto que o caracterize, desconsiderando o desempenho dos 4 anos, ou a diferença de quando iniciou para quando terminou. Isso, no entanto, não é suficiente; nenhum governo pode ser julgado por sua trajetória pura e simplesmente, sem considerar a trajetória dos outros estados ou do mundo de um modo geral na época.

É impossível desconsiderar o peso das crises asiática/mexicana/russa durante o governo FHC (todos países emergentes como nós, seguindo em parte o consenso de Washington como nós, com câmbio frágil e reservas internacionais fragilizadas como nós).

Do mesmo modo, é impossível desconsiderar o peso do crescimento chinês durante o governo Lula (a china vem crescendo 10 a 15% desde a déc. 80 todo ano, e tornou-se grande importadora de commodities brasileiras com seu mercado gigante).

Por isso não faz sentido algum comparar o PIB em ambos os casos. Faria sentido comparar o crescimento do PIB acumulado nos períodos. Exclusivamente pelo desempenho, o governo Lula é muito melhor; considerando-se as dificuldades do cenário, porém, não tanto - tendo em vista principalmente a continuação das políticas do governo anterior. É extrema cegueira avaliar sem o contexto internacional.

Mesmo em 2018 parece necessário dizer isso. As pessoas se importam hoje demasiadamente com símbolos, ao ponto que praticamente ignoram aspectos cruciais da avaliação factual de resultados. Os mandatos têm relevância no simbólico, mas a mudança real que eles produzem é na ação prática. Caso contrário, não é meritória.

Se um político é amado mesmo tendo resultados ruins e produtividade ultra-baixa, ou odiado mesmo tendo resultados melhores que a maioria de seus pares e apesar das dificuldades, ele é amado/odiado pelo que fez ou simplesmente por uma imagem criada em torno de si - isto é, pelo conteúdo imagético de si presente na memória do povo?

Se é o segundo, então não há mérito ou demérito; nada tem a ver sua avaliação com o que realmente é o candidato. O que há é uma esquizofrenia coletiva mutuamente assistida e legitimada.

Se é o primeiro, então pode ou não haver um problema associativo. Primeiro pela ausência de análise fria, com critérios neutros e sem ideologia. É perfeitamente racional entender e adotar após estudo um conjunto complexo de idéias e princípios, mas é preciso Também uma análise fria. Colocar o destino de um país a serviço de uma ideologia, que justificaria a diferença de critérios racionais, sem comparativos, é insensato. Mas pode não ser o caso de uma ideologia propriamente dita, apenas um ideário mais tosco sem substância, ou meramente oportunismo fisiológico.

Não deveria haver uma "Classe" política. O político deveria ser uma pessoa do povo, que serve a ele - logo a si mesmo, e o grupo de políticos que administra e conduz o país deveria ser apenas uma fração da população, sem um distintivo simbólico instituído. Talvez por herança de tempos aristocráticos/oligárquicos, o Brasil herdou uma mentalidade de casta que opera nesse caso, o que contribui para o culto à imagem.