domingo, 20 de outubro de 2013

Manifesto por uma Nova Instituição de Acolhimento ao Calouro

Mais especificamente sobre o trote do curso de Cinema da UFF, este artigo foi inspirado por uma manifestação contra o trote que ocorreu no grupo de Cinema.

Eu não participei tanto, à altura, do tópico relacionado, mesmo por que como já disse em outro texto, nem sempre as pessoas querem construir uma opinião elaborada ou encontrar verdades. O que acontece é uma inevitável briga animalesca entre egos - com o intuito único de provar que o outro está errado.

Fiz apenas uma colocação no sentido de situar o que de fato é o trote. Para além da argumentação feita ali no grupo, o que pode não ter ficado claro acerca do meu posicionamento é que eu sou contra o trote e defendo o rompimento com esta tradição - porém respeito a liberdade individual, e se outros grupos quiserem fazer, problema é deles.

Discutam com seus amigos e perguntem quais deles fizeram trote, e peçam para que eles reflitam sobre o quanto isso foi relevante na sua socialização enquanto calouro, e quais são suas experiências a respeito.

Não é preciso ser um gênio para saber que a relevância do trote enquanto forma de socializar os calouros é mínima ou nula - e ainda diria que se não é nula, é para pior, não para melhor. É brilhante como algumas pessoas acreditam mesmo que colocar a cara na farinha e se sentir fudido junto com os amigos cria senso de união - ao invés de acreditar na convencional construção paulatina do bom relacionamento, na apropriação do espaço da faculdade, essas coisas bobas. 

Portanto não vou perder meu tempo chutando cachorro morto, e dando adjetivos negativos bonitos ao trote estudantil, dizendo por que é humilhante, contribui para a reprodução do comportamento não-desperto, de reafirmação da opressão, etc. Para mais, leiam aqui: http://pt.wikipedia.org/wiki/Trote_estudantil

Falo aqui de uma possível ressignificação. Sou contra. O trote é uma brincadeira imbecil, só isso. Não se faz uma brincadeira imbecil sem a imbecilidade. Brinca-se de outra coisa.

Se é possível falar nesses termos, o trote enquanto instituição tem história, nome, significados e ressignificados, todos em torno de (mesmo que em tom crítico) sua essência, que se não é algo exato, certamente é constituído de elementos de um lugar comum do inconsciente, e evidentemente reafirma o status quo em alguma parte, queira ou não.

Defendo, portanto, a abolição desse tipo de prática e a construção de uma nova instituição em seu lugar. Com outro nome, que reflita uma outra essência, a partir da qual a significação e a ressignificação seja feita, constituindo elemento cultural e herança cultural (étnica, se assim vale).

Já é previsível aí a vontade dos estudantes de cinema, por exemplo, de produzir vídeos com e para os calouros. Essa herança, deixada em memórias, textos, vídeos, enfim obras de pensamento, refletiriam essa essência e nome novos, e constituiriam cultura.

Evidentemente, esse debate passa pela definição de Educação: o conjunto de fenômenos de aprendizado e ensino que acontece simultaneamente na transposição das gerações, isto é, no encontro, choque e mistura entre uma geração mais velha e outra mais nova. E nessa interface é que acontece produção e perpetuação de conhecimento e cultura. Nesse sentido que faz uma tentativa de retorno à essência (sem muito rigor argumentativo, usando apenas com objetivos clareadores), a nova instituição referida deveria servir também para uma maior apropriação do espaço da faculdade, ao invés de servir exatamente ao contrário, criando espantalhos do ambiente acadêmico discente e docente.

Ao invés de perder tempo colocando a cara na farinha e perpetuando as mesmas besteiras de sempre, por que não produzimos um legado cultural que jogue o calouro para o olho do furacão que é a educação superior? Que deixe ele sabendo o que caralhos significa Pró-Reitor. Você sabe o que é um e pra que serve - ou mesmo quem são eles?

Schopenhauer, ainda na linha do comentário sobre a discussão, lembra: tanto ler e aprender quanto escrever e ensinar, quando em excesso, são prejudiciais ao pensamento próprio e à clareza e profundidade de saber. Sendo assim esse diálogo Constante (entre as novas gerações), além de ser a essência da educação e portanto a coisa mais importante que deve haver dentro de um ambiente acadêmico, é a própria construção e perpetuação da consciência e do espaço que conhecemos por Universidade.

Se uma das idéias reformistas do trote era de uma real integração do calouro, ao invés de um mero uso desse pretexto para na verdade perpetuar os mesmos preconceitos e comportamentos reafirmadores de características do status quo, acho que esse é o único caminho.

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